segunda-feira, 11 de junho de 2018

Conto de um turista no Japão, por Rodrigo Barbosa


Me perguntaram como alguém pode ser “acidentalmente convertido” ao budismo. Senta aí que lá vem história.
Estava eu andando na rua de boa e pans, sendo um turista comum. Um casal de velhinhos se aproxima. Super simpáticos, começam a me fazer perguntas: de onde sou, pra onde vou, se o Zico é famoso no Brasil, etc etc.
Papo vai papo vem, lá pelas tantas, viram e dizem:
- Nós pertencemos a uma seita. Você quer conhecer nosso templo?
Isso foi meio inesperado. Mas a verdade é que tava quente pra caceta ficar parado ali no meio da rua.
- Po tô fazendo nada mermo... vamo nessa.
Corta pro templo. O lugar até que era bem bonitinho: um típico jardim japonês do lado de fora; dentro, tatames e portas deslizantes. O altar principal, preto com detalhes em ouro, era ao mesmo tempo suntuoso e minimalista. Três lustres dourados pendiam do teto; num canto, um tambor cerimonial. Havia também uma sala oculta de orações, à qual eu tive acesso graças à posição dos meus novos amigos na hierarquia do templo.
Em um dado momento, eles resolveram me ensinar a doutrina. Bom, o inglês deles era bem ruim então eu entendi tipo 5%, mas o crucial é que tem um mantra principal, que deve ser repetido sempre:
“Água, fogo, terra, ar, abismo”
Sim, isso mesmo: ABISMO. É basicamente o que você fala pra invocar o Capitão Planeta, só que os caras são mais trágicos e trocaram “coração” por “abismo”.
Palavras aprendidas, eles vieram com a bomba.
- Você quer participar de uma cerimônia?
- Uai... POR QUE NÃO?
Lá fomos nós então, sentou um monge e começou a recitar umas paradas e eu tinha que repetir. Foram 10 min que exigiram o máximo da minha concentração, pois ao mesmo tempo que eu não fazia ideia do que estava falando, do nada surgiam uns “ken-ga”, “mi-jo”, fora os vários “nu-ku”. Enfim, sobrevivi.
No total tudo durou uns 15 min, os caras realmente botam fé nesse esquema doutrinação a jato. Nada de dar uma questionada no teu cristianismo, uma massageada no teu Nietzsche, nananão, eles já chegam te dando um tapão de fogo, água e abismo. Beleza, tamo aqui pra isso. Finalmente, o monge falou (penso eu): “cabô fi, vc tá convertido, pode ir e pregar nossa palavra pro mundo”.
No fim das contas, acho que escolheram uma péssima pessoa pra espalhar a seita por aí. Realmente só aprendi o tal do “água, fogo, terra, ar, abismo”, e olhe lá.
Mas pelo menos os velhinhos ficaram super felizes. Me acompanharam até a saída, me deram uns biscoitos de blueberry e um chá verde, e um abraço de boa viagem. E eu voltei a ser um turista comum.

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